PMLS – Programa Mais Leite Saudável: Reforma Tributária e os Novos Desafios
A cadeia produtiva do leite no Brasil é uma das mais relevantes do agronegócio nacional, movimentando bilhões de reais por ano e sustentando milhões de empregos diretos e indiretos. No entanto, durante décadas, o setor enfrentou desafios relacionados à baixa produtividade, falta de assistência técnica, informalidade e qualidade do leite aquém dos padrões internacionais.
Com o objetivo de enfrentar essas questões de maneira estruturada e sustentável, o Governo Federal lançou, em 2015, o Programa Mais Leite Saudável (PMLS). Ao adotar um modelo de incentivo fiscal para estimular investimentos privados na base produtiva, o programa vem transformando a realidade de milhares de produtores de leite em todo o país.
Neste artigo, apresentamos a trajetória do programa, seus resultados concretos, os possíveis impactos da reforma tributária e as perspectivas para o futuro da produção leiteira brasileira.
Origens e Evolução do Programa Mais Leite Saudável
O Programa Mais Leite Saudável (PMLS) foi instituído pelo Decreto nº 8.533, de 30 de setembro de 2015, como uma política pública do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). O objetivo principal era criar uma alternativa sustentável para incentivar a melhoria da qualidade e da produtividade do leite no Brasil, sem recorrer ao subsídio direto.
A inovação do programa está em seu modelo de funcionamento: as empresas beneficiárias, como laticínios, agroindústrias e cooperativas, podem se credenciar no PMLS e apresentar projetos voltados para o desenvolvimento dos produtores rurais de leite com os quais se relacionam. Em troca, recebem o direito de utilizar até 50% dos créditos presumidos do PIS/Pasep e da Cofins sobre o leite in natura adquirido como insumo.
Entre 2015 e 2018, o programa passou por uma fase de estruturação. Os primeiros projetos-piloto envolveram grandes cooperativas e empresas, que testaram diferentes metodologias de assistência técnica, capacitação e melhorias na infraestrutura das propriedades.
A partir de 2019, o programa começou a ser mais amplamente divulgado e acessado, inclusive por empresas de menor porte. Esse movimento foi fortalecido por atualizações normativas, como a Portaria nº 304/2022, que trouxe mais clareza e flexibilidade aos procedimentos de adesão e execução dos projetos.
Resultados e Impactos do Programa
Desde sua criação, o Programa Mais Leite Saudável (PMLS) tem gerado impactos expressivos tanto na base produtiva quanto nas empresas participantes. De acordo com dados do MAPA:
- Mais de 65 mil produtores rurais foram atendidos diretamente por projetos apoiados pelo PMLS.
- Mais de 1 bilhão de litros de leite foram impactados por ações de melhoria de qualidade e produtividade.
- Estima-se que mais de R$ 500 milhões em créditos tributários foram direcionados à cadeia produtiva do leite, por meio de projetos aprovados no programa.
- Em muitas propriedades atendidas, observou-se um aumento de até 18% na produtividade por vaca, reflexo de práticas mais modernas de manejo, nutrição e sanidade animal.
- Índices de mastite e contagem bacteriana total, dois dos principais indicadores de qualidade do leite, foram significativamente reduzidos em propriedades assistidas, melhorando a competitividade do leite nacional.
Além dos números, o PMLS contribuiu para fortalecer a relação entre indústria e produtor, promovendo uma lógica de parceria e desenvolvimento mútuo, em vez de apenas uma relação comercial de compra e venda.
O Papel Estratégico do PMLS para o Setor Leiteiro
O PMLS representa uma política pública estratégica por diversos motivos. Primeiro, ele está estruturado sobre uma base de incentivo e não de subsídio direto, o que o torna mais sustentável e eficiente no longo prazo. Segundo, ele atua sobre a base da cadeia produtiva, promovendo a formalização, a assistência técnica e o acesso à tecnologia em regiões onde essas ações historicamente não chegavam.
Terceiro, o programa cria um ambiente propício para a inovação. Muitos dos projetos aprovados têm incluído o uso de tecnologias como softwares de gestão pecuária, sensores para monitoramento do rebanho, controle digital de qualidade do leite, entre outras soluções. Isso aproxima os produtores da agricultura 4.0 e contribui para o aumento da competitividade do setor frente aos padrões internacionais.
Por fim, o PMLS contribui para objetivos mais amplos da política agropecuária nacional, como segurança alimentar, sustentabilidade ambiental e geração de renda no meio rural.
Reforma Tributária e os Novos Desafios para o PMLS
A recente aprovação da reforma tributária no Brasil, que prevê a substituição de diversos tributos federais (incluindo PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), traz implicações diretas para programas baseados em crédito fiscal, como é o caso do Programa Mais Leite Saudável.
Como o PMLS utiliza créditos presumidos de PIS e Cofins como incentivo para que empresas invistam em projetos com produtores rurais, a reformulação desses tributos pode impactar o modelo de funcionamento do programa. Especialistas têm alertado para a necessidade de que, durante a regulamentação da nova estrutura tributária, sejam previstos mecanismos de compensação ou continuidade desses incentivos, de forma a não comprometer os avanços já alcançados.
Caso o PMLS não seja contemplado nas novas diretrizes fiscais, há risco de desaceleração de investimentos privados na base da cadeia produtiva do leite. Por outro lado, se bem incorporado à nova estrutura, o programa pode servir de modelo para futuras políticas setoriais baseadas em benefícios tributários inteligentes e vinculados à melhoria de indicadores socioeconômicos.
O setor leiteiro, representado por cooperativas, associações e federações, já tem mobilizado esforços junto ao Congresso Nacional e ao Executivo para garantir a manutenção do PMLS no novo regime tributário.
Perspectivas Futuras: Sustentabilidade, Digitalização e Expansão
As perspectivas para o Programa Mais Leite Saudável nos próximos anos são promissoras, desde que se preserve sua sustentabilidade fiscal diante da reforma tributária. Com a crescente digitalização do campo e a demanda por produtos lácteos de maior qualidade, espera-se que o programa continue sendo um pilar central para o desenvolvimento da cadeia leiteira brasileira.
Algumas das tendências previstas incluem:
- Adoção crescente de ferramentas digitais para a assistência técnica, como aplicativos, plataformas online e inteligência artificial, que permitirão o monitoramento remoto e personalizado das propriedades.
- Integração com políticas voltadas à sustentabilidade, como o Plano ABC+, promovendo práticas de baixo carbono na produção leiteira.
- Expansão do programa para outras modalidades da pecuária leiteira, como caprinocultura e bubalinocultura, além do fortalecimento da agricultura familiar.
- Fortalecimento da rastreabilidade e conformidade com padrões sanitários internacionais, facilitando o acesso a mercados exigentes como Europa, Estados Unidos e China.
O Programa Mais Leite Saudável (PMLS) é um exemplo de política pública inteligente, que combina eficiência econômica com impacto social. Em vez de depender de subsídios pontuais, ele aposta na capacitação, na parceria entre empresa e produtor, e no uso estratégico de créditos tributários para transformar a produção de leite no Brasil.
Com a reforma tributária em curso, é fundamental garantir a continuidade de programas como o PMLS, adaptando seus mecanismos à nova realidade fiscal. Se bem conduzido, o processo pode não apenas preservar os avanços conquistados, mas também abrir caminho para políticas públicas ainda mais eficientes, tecnológicas e inclusivas no agronegócio nacional.